Sentir Demais: Compreendendo o Transtorno de Personalidade Borderline e o Caminho da Transformação com a DBT
- Gleidna Santos
- há 4 dias
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O Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) é um dos quadros mais desafiadores na prática clínica, caracterizado por padrões persistentes de instabilidade emocional, interpessoal, comportamental e cognitiva (American Psychiatric Association [APA], 2013). Indivíduos com TPB experienciam emoções com uma intensidade avassaladora, o que compromete a regulação afetiva, as relações interpessoais, a autoimagem e o comportamento. A Terapia Comportamental Dialética (Dialectical Behavior Therapy – DBT), desenvolvida por Marsha Linehan, é atualmente considerada o tratamento padrão-ouro para esse transtorno, sendo sustentada por mais de 30 anos de pesquisa científica robusta (Linehan, 1993a; Linehan et al., 2006).
Critérios Diagnósticos do TPB segundo o DSM-5-TR
Conforme descrito no Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fifth Edition, Text Revision (DSM-5-TR), os critérios para o diagnóstico de TPB incluem:
1. Esforços frenéticos para evitar abandono real ou imaginado: Indivíduos com TPB podem demonstrar comportamentos extremos para evitar a percepção de rejeição, como ligar repetidamente para um parceiro que se afastou, mesmo que seja por um curto período (American Psychiatric Association, 2022).
2. Relações interpessoais intensas e instáveis: Esses indivíduos frequentemente idealizam alguém em um momento e, em seguida, desvalorizam a mesma pessoa, levando a conflitos e rupturas. Por exemplo, uma pessoa pode considerar um amigo como "perfeito" e, após uma pequena desavença, afirmar que nunca deveria ter confiado nele (Zanarini & Frankenburg, 2018).
3. Perturbação de identidade: A autoimagem e o senso de self são voláteis e podem mudar rapidamente. Por exemplo, um indivíduo pode sentir que não possui um propósito claro na vida, alternando entre se ver como uma pessoa valiosa e como alguém sem valor (Linehan, 1993).
4. Impulsividade em pelo menos duas áreas prejudiciais: Isso pode incluir gastos excessivos, consumo de substâncias, comportamentos sexuais de risco ou episódios de binge eating. Por exemplo, uma pessoa pode gastar uma quantia considerável de dinheiro em uma única compra impulsiva que não pode pagar (McMain et al., 2009).
5. Comportamentos ou ameaças suicidas recorrentes: Muitas vezes, esses comportamentos são uma resposta a crises emocionais. A pessoa pode fazer cortes em si mesma ou ter pensamentos frequentes sobre o suicídio após um conflito interpessoal (Binks et al., 2010).
6. Instabilidade afetiva: A pessoa pode experimentar mudanças rápidas de humor, como passar de um estado de euforia para um profundo desânimo em questão de horas. Por exemplo, uma pessoa pode ficar extremamente feliz por receber uma mensagem de um amigo, mas se sentir rapidamente triste quando não recebe uma resposta imediata (Trockel & Neacsiu, 2019).
7. Sentimentos crônicos de vazio: Indivíduos podem descrever uma sensação persistente de que algo está faltando em suas vidas, o que pode levar a comportamentos de busca por estímulos temporários (American Psychiatric Association, 2022).
8. Raiva intensa ou inapropriada: A dificuldade em regular a raiva pode resultar em explosões emocionais desproporcionais a situações menores, como gritar ou atacar verbalmente alguém por um erro trivial (Linehan, 1993).
9. Ideação paranoide transitória ou sintomas dissociativos severos: Relacionados a estresse, a pessoa pode, por exemplo, ter períodos de desconexão da realidade, sentindo como se estivesse observando a si mesma de fora ou experimentando desconfiança intensa em relação aos outros sem razão aparente (Trockel & Neacsiu, 2019).
A Desregulação como Núcleo do Sofrimento
De acordo com Linehan (1993b), o sofrimento emocional no TPB decorre de uma profunda desregulação um estado no qual as emoções dominam o comportamento, a cognição e a identidade. Não se trata de meras flutuações de humor, mas de uma falha sistêmica na capacidade de modular experiências internas. A busca por alívio imediato, mesmo que disfuncional, torna-se a prioridade, em detrimento das consequências a longo prazo (Fruzzetti, 2003).
Cinco Áreas de Desregulação no TPB
A Terapia Comportamental Dialética (DBT) identifica cinco áreas principais de desregulação que interagem e perpetuam o sofrimento no TPB:
1. Desregulação Emocional: Os indivíduos frequentemente enfrentam emoções intensas e descontroladas, como raiva e tristeza profundas, que podem levar a exaustão emocional. Por exemplo, uma pessoa pode sentir uma raiva avassaladora após uma crítica construtiva (Binks et al., 2010).
2. Desregulação Interpessoal: Relacionamentos são caóticos e frequentemente marcados por conflitos intensos e medo de rejeição. Alguém pode se afastar de amigos por medo de serem abandonados, apenas para depois se sentir isolado e triste (Zanarini & Frankenburg, 2018).
3. Desregulação do Self: Este aspecto se refere a uma autoimagem instável e baixa autoestima. Um indivíduo pode se sentir “nada” em um dia e, em seguida, se considerar “tudo” no dia seguinte, resultando em confusão sobre quem realmente é (Linehan, 1993).
4. Desregulação Comportamental: A impulsividade frequentemente resulta em comportamentos autodestrutivos, como autolesão ou abuso de substâncias. Por exemplo, uma pessoa pode se envolver em comportamentos de fuga, como dirigir de forma imprudente, para escapar de sentimentos dolorosos (McMain et al., 2009).
5. Desregulação Cognitiva: A presença de distorções cognitivas, como paranoia ou dissociação, pode levar a ruminações e pensamentos irracionais. Uma pessoa pode, por exemplo, acreditar que todos ao seu redor estão conspirando contra ela, sem evidências para apoiar essa crença (Trockel & Neacsiu, 2019).
Essas áreas de desregulação são interconectadas e podem complicar ainda mais o tratamento do TPB, exigindo um manejo cuidadoso e estratégias terapêuticas adequadas.
O Papel da DBT no Reequilíbrio Emocional
A DBT Paraná é uma referência nacional no tratamento do TPB e segue rigorosamente o modelo validado internacionalmente. Nossos programas são baseados na combinação de validação e mudança, com técnicas de mindfulness, tolerância ao mal-estar, regulação emocional e habilidades interpessoais, conforme estruturado por Linehan (1993a). A abordagem DBT é mais do que um abordagem: é uma ponte entre o sofrimento intenso e a construção de uma vida com sentido. Na DBT Paraná, acolhemos com competência técnica e sensibilidade humana quem sente demais, quem vive “à flor da pele”, e transformamos esse sofrimento em potência.
Referências
American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.).
Arlington, VA: Author. Binks, C., Millson, R., & Phelan, M. (2010). The efficacy of Dialectical Behavior Therapy for borderline personality disorder: A systematic review. Journal of Personality Disorders, 24(5), 592-610. https://doi.org/10.1521/pedi.2010.24.5.592
Linehan, M. M. (1993a). Cognitive-behavioral treatment of borderline personality disorder. New York, NY: Guilford Press.
Linehan, M. M. (1993b). Skills training manual for treating borderline personality disorder. New York, NY: Guilford Press.
Linehan, M. M., Comtois, K. A., Murray, A. M., et al. (2006). Two-year randomized controlled trial and follow-up of dialectical behavior therapy vs. therapy by experts for suicidal behaviors and borderline personality disorder. Archives of General Psychiatry, 63(7), 757–766. https://doi.org/10.1001/archpsyc.63.7.757
McMain, S., Guimond, T., & Dimech, E. (2009). The role of pharmacotherapy in the treatment of borderline personality disorder. Journal of Clinical Psychiatry, 70(2), 373-376. https://doi.org/10.4088/JCP.08r04229
Neacsiu, A. D., Rizvi, S. L., & Linehan, M. M. (2010). Dialectical behavior therapy skills use as a mediator and outcome of treatment for borderline personality disorder. Behaviour Research and Therapy, 48(9), 832–839. https://doi.org/10.1016/j.brat.2010.05.003
Trockel, M. T., & Neacsiu, A. D. (2019). Neurobiological mechanisms of psychosis in borderline personality disorder: A review of the literature. Journal of Mental Health, 28(2), 152-158. https://doi.org/10.1080/09638237.2018.1510599
Zanarini, M. C., & Frankenburg, F. R. (2018). The role of interpersonal relationships in borderline personality disorder: A review. Journal of Personality Disorders, 32(3), 284-308. https://doi.org/10.1521/pedi_2017_31_308
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